Caso Diniz: fala a defesa.

Caso Diniz: fala a defesa.

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7 de janeiro de 1999, 23h00

Após pronunciamento final do Tribunal de Justiça de São Paulo, e na conformidade do nosso Código de Ética Profissional que determina: “O advogado deve abster-se … de debater, em qualquer veículo de divulgação, causa sob o seu patrocínio ou patrocínio de colega.”( Artigo 33, inciso II )

Depois de nove duros e pesados anos de defesa, e da pretensão e raramente do conhecimento daqueles que indevidamente se pronunciaram sobre o caso que patrocinei, fossem eles advogados, políticos, médicos, economistas, em fim, todo tipo de gente metediça, até mesmo aqueles portadores de algum juízo e humanidade, venho, revestido da humilde e passageira autoridade de defensor, tentar repor algumas verdades.

Fato é que, por determinação de D. Paulo Evaristo Arns, homem de virtudes incomparáveis e para quem todos os democratas deste país tem uma dívida irresgatável de gratidão pelo seu constante exemplo de dignidade, coragem e amor incontido pelos seus semelhantes, tomei a defesa dos então acusados, com todo o entusiasmo que me animava.

Era meu objetivo, na minha expectativa profissional, dar aquela pessoas tresmalhadas da justiça, o que era seu por direito. Começaram os trabalhos. Iniciaram as perseguições.

Desde o fórum onde tentaram impedir a entrada do seu advogado, até o exíguo prazo de estudos que me foi deferido para a produção da defesa.

Iniciava uma guerra entre o todo poderoso Estado e nove acusados estrangeiros, um brasileiro e seu simples advogado.

Por felicidade, mesmo nos Estados que apresentam disfunções quase insanáveis como o nosso, encontram-se seres humanos de espírito superior e de visão ampla sobre as funções que o povo lhes deferiu.

Neste caso tive a sorte de me deparar com o Eminente Juiz ROBERTO CALDEIRA BARIONI, que com rigor, tranqüilidade de espírito, interessado apenas na distribuição da Justiça, tão bem soube conduzir o feito.

Ao final do processo em primeira Instância, sob a égide do seu rigoroso discernimento, estipulou penas duras, mas de acordo com o Código Penal. Assim, foram todos proporcionalmente condenados a penas que variavam entre 8 e 15 anos de reclusão.

Neste passo, convém lembrar que os acusados jamais fugiam de suas responsabilidades, quer negando culpas, quer manipulando fatos.

No cumprimento da pena, agiram sempre ordeira e disciplinadamente, cumprindo normas impostas por um sistema carcerário infame, decadente e avassalador do que pode restar de dignidade humana para aqueles que, como condenados, passam a conviver naquele inferno de indecência, degradação e iniquidade.

Os presos, durante longo período não “tugiram nem mugiram”. Sabiam ter infringido a lei e arrostaram com dor e lágrimas as conseqüências do crime cometido.

Como é do seu direito e de qualquer um, recorreram da decisão. Para a sua surpresa e de todos quanto lidam no mundo jurídico, tiveram suas penas aumentadas ao máximo estarrecedor de 26 a 28 anos, sem que, pelo menos, a conduta de cada um fosse analisada.

Por que todos os cânones jurídicos derrogados ? Por que o justo foi enxovalhado ?

Esta a perplexidade.

Um tribunal coletivo, à unanimidade, julgar contra a lei num sistema democrático, é coisa inconcebível para a qualquer um do povo.

O que se dizia, então, é que a opinião pública estaria a favor da decisão.

Mas na verdade, não se sabe porque, ou melhor, sabe-se bem porque, quem estava a favor era a mídia irresponsável e sensacionalista, que jamais poderá ser confundida com o povo, especialmente o povo brasileiro.

Na verdade, todos os tribunais superiores do País, como o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, consideraram, pelos seus mais importantes juizes, o crime praticado pelos acusados como de origem e finalidades políticas, devendo assim ser tratados de forma mais benevolente, eis que não visam vantagens pessoais, sim altruísticas, objetivando sempre, não o dano, mas a melhoria das condições de vida coletiva.

Ensinam as melhores concepções de direito que na evolução dos povos, todas as transformações político-sociais da humanidade, processam-se, geralmente através de movimentos que integram tipos de crimes políticos.

Vitoriosos, os seus autores são proclamados heróis; vencidos, são processados e punidos, mas suas idéias inspiram muitas vezes novos movimentos, possivelmente mais felizes, consagrando-se então mártires os seus precursores.

Vide o recente caso do Presidente Mandela, na África do Sul, que saiu dos cárceres para pacificar a nação.

Hoje, a situação dos sete estrangeiros e do último brasileiro presos, é a de que, após cumprirem com inusitado rigor o tempo de prisão correspondente a nove anos, segundo decisão do 2º Grupo de Câmaras Criminais do Tribunal de Justiça, todos têm direito ao livramento condicional.

De alguma forma, embora tardia, houve parcial reposição do equilíbrio da justiça.

Mais do que isso, o Poder Executivo tomou medida humanitária de, como deferido aos canadenses, colocar à disposição dos seus países de origens os demais acusados e fazer cumprir o que lhes resta de pena o mais próximo possível dos seus familiares. Medida esta que, apesar da incompreensível insurgência do Procurador de Justiça do Estado de São Paulo, foi ratificada pelo I. Ministro do Supremo Tribunal Federal, Sepúlveda Pertence.

Via de conseqüência, espera a consciência jurídico humanística da nação que sejam superadas as iníquas e inadequadas burocracias pertinentes, fazendo nascer, com este caso, uma nova flor e uma nova luz de beleza e de bondade para onde voltarão os olhos sofridos dos cidadãos de todos os cantos do mundo que tem esperança na vida e desejo de um futuro menos cruel.

Onde sejam banidos do convívio humano, países mais fortes sem qualquer autorização, bombardeiem outros, matando crianças, aleijando idosos, fugindo a todas as tradições da evolução da espécie e das crenças que sedimentaram o que há de melhor nas mentes e nos corações de cada um de nós.

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