Dívida dolarizada

Veja o que se pode alegar para alterar seu contrato em dólar

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10 de fevereiro de 1999, 23h00

Um dos argumentos válidos que se tem utilizado para alterar a abrupta correção de prestações indexadas à variação cambial é um dispositivo do Código de Defesa do Consumidor. Em seu artigo 6º, inciso V, o CDC estabelece que “São direitos básicos do consumidor: (…) V – a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas”.

A primeira decisão obtida com base nesse dispositivo, em favor de um consumidor, foi impetrada pelo Procon de Belo Horizonte – MG. Segundo o coordenador do Procon, Délio Malheiros, a cláusula que estabelece a correção cambial dos contratos não é ilegal, mas deve ser revista quando se torna onerosa em decorrência de fatos imprevisíveis.

A teoria da imprevisão é outra tese usada para encontrar um meio termo entre as partes contratadas. A teoria diz que quando as condições anteriormente contratadas são alteradas de modo repentino ou imprevisto, não é possível manter o que foi pactuado anteriormente. A desvalorização do real é considerada, por advogados, uma dessas situações.

Para o especialista Eduardo Diamantino, do escritório Diamantino Advogados Associados, o que permite a revisão é o desequilíbrio contratual gerado pela brutal desvalorização da moeda nacional. Segundo ele, “a primeira ação nesse sentido, no Brasil, aconteceu na década de 40, quando produtores de algodão não conseguiram honrar seus compromissos contratados em decorrência de problemas climáticos”.

A seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil também entrou na briga. Uma liminar obtida pela entidade, junto a 1ª Vara da Justiça Federal de São Paulo, beneficiou todos domiciliados no estado de São Paulo.

Pela decisão do juiz José Henrique Prescendo, as prestações indexadas à variação do dólar, nos contratos de leasing, a partir de janeiro de 1999 até o final dos contratos devem ser corrigidas pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor. Mas a sentença determinava também que “a diferença entre a variação cambial e a variação do INPC deverá ser paga após o término do contrato, em parcelas de valor real igual ao da última prestação do contrato”.

Na prática, as prestações atuais continuariam as mesmas, mas quando o consumidor acabasse de pagá-las teria de negociar a diferença que não foi cobrada com as financeiras e continuar pagando prestações no mesmo valor, até que fosse atingido o valor residual.

No entanto, essa determinação foi derrubada. Em 26 de fevereiro, a OAB-SP conseguiu o efeito suspensivo contra a liminar concedida pelo juiz da 1ª Vara Federal, José Henrique Prescendo.

Com a nova decisão, os consumidores não terão de arcar com o resíduo ao final dos contratos. Segundo o advogado José Eduardo Tavolieri de Oliveira, membro da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB-SP, “os consumidores deverão pagar suas prestações corrigidas unicamente pela variação do INPC”.

Muitos consumidores estão pleiteando o direito de devolver o bem adquirido – veículos, na maioria dos casos. As financiadoras, por sua vez, informam ao consumidor que com a devolução do bem, o mesmo será leiloado. Se o valor arrecadado com o leilão não atingir o montante que seria pago até o final do contrato, o consumidor terá de arcar com a diferença.

Segundo o membro da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB-SP, José Eduardo Tavolieri de Oliveira, existem decisões de tribunais superiores que versam em sentido contrário à posição das financiadoras. “Mas trata-se de jurisprudência, na devolução, se o consumidor se sentir prejudicado, deve procurar a Justiça individualmente para que seu caso seja estudado”, afirma o advogado.

Para Tavolieri, a única atitude que o consumidor não deve tomar é ficar inadimplente, pois isso beneficiaria as financiadoras. O primeiro passo a ser dado é a tentativa de um acordo com a financeira. Em caso de negativa, o interessado deve abrir uma conta especial em uma instituição financeira oficial, ou seja, ligada ao Estado e efetuar o depósito do valor em dinheiro. Feito o depósito, o consumidor deve redigir e mandar uma carta para a financiadora estabelecendo um prazo de dez dias para possível recusa. É imprescindível que a carta seja enviada com Aviso de Recebimento (AR). Se deparando com nova recusa, a alternativa derradeira é a contratação de um advogado para propor uma ação de consignação em pagamento.

Outro ponto esclarecido por Tavolieri, em que concorda o advogado Diamantino, é a origem do recurso captado. Não importa se o bem adquirido seja importado ou nacional, o que pesa é se o banco obteve recursos em dólar para o financiamento do bem adquirido.

Segundo Diamantino, “os bancos tem de provar que obtiveram recursos no exterior para o financiamento do bem para que seja legítima a cobrança em dólares”.

A respeito da matéria contratual, veja o que diz, o especialista em Direito do Consumidor, Nélson Nery, na editoria de artigos, sob o título “Em defesa do consumidor”.

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