A Revolução do MP3

A Revolução do MP3

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15 de dezembro de 1999, 23h00

Recentemente manuseei pela primeira vez um aparelho portátil em formato MP3, em viagem a Nova Iorque. Encorajado pelo vendedor de uma loja de eletroeletrônicos, escutei diversas músicas na maquininha e o som me pareceu realmente fantástico, contrário ao que pensam as grandes companhias de disco.

Em síntese, o MP3 permite a qualquer músico compor, gravar e vender faixas com qualidade digital igual à dos CDs sem a intervenção de qualquer revendedor atacadista ou varejista (ou, em outras palavras, sem a necessidade de um diretor de A&R de uma gravadora).

Rumores distantes que nos chegam dos EUA e da Europa informam que o formato MP3, que oferece arquivos musicais digitais em razoável velocidade através da Internet está se combinando com os gravadores de CDs (CD Recordables) para revolucionar a indústria da música.

Certamente não é uma refeição agradável para a cadeia alimentar de US$ 40 bilhões/ano representada pela indústria global da música. Mas será que isso realmente representa algo ruim para a música?

A IFPI – International Federation of the Phonographic Industry, a Federação Internacional da Indústria Fonográfica, entidade com sede em Londres que congrega as grandes gravadoras, diz que o formato MP3 vem sendo capturado (downloadeado) mais de 3 milhões de vezes por dia em todo o mundo pela Internet, a maioria, segundo a instituição, pirata, sem pagar direitos autorais. A ironia está em que as forças determinantes que transformaram a indústria do disco na década de 60 – então de proporções tacanhas – no gigante global dos dias de hoje, foram justamente as mudanças de formato, que ocorreram em média uma vez em cada década.

Também é interessante notar que as mesmas gravadoras que hoje esperneiam contra o MP3, foram as primeiras a perseguir a melhor qualidade sonora para os seus consumidores, com a introdução dos discos de vinil, do cartucho stereo-8, da fita cassete e finalmente, do compact disk. A empresa de pesquisa estatística americana Forrester Research vislumbra um crescimento de cerca de 7% de vendas de produtos musicais online até 2003, sendo uma fração desse número gerada na Ásia. Mas basta uma olhada detalhada nos problemas estruturais das gravadoras majors para implementar o mercado musical asiático recentemente, somada às ambiciosas projeções do tráfego conectado à Internet em mercados como a China, e podemos tranqüilamente projetar o sucesso do MP3 no Ocidente muito em breve.

Em mercados pop mais estabelecidos, artistas como Prince, David Bowie e Lobão aqui no Brasil, já adotaram a revolução do MP3. A médio prazo os discos serão compostos, gravados, produzidos e mixados em computadores pessoais domésticos (PCs), utilizando tecnologias como Pro Tools e CuBase, um processo de substancial barateamento dos tradicionais gastos com estúdios convencionais.

Músicas e álbuns inteiros já estão sendo comprimidos, inseridos na Grande Rede (uploaded) e comercializados em todo o planeta à velocidade da luz, depois capturados (downloaded) na ponta de destino e “queimados” num CD gravável pelos consumidores. Ôpa, alguém está sentindo falta da gravadora?

Na Ásia, onde a qualidade do produto musical está num distante segundo lugar em relação à embalagem e ao marketing do artista – a televisão, shows e merchandising – uma revolução desse nível poderá levar ainda algum tempo, mas as gravadoras ocidentais já estão bastante preocupadas e empenhadas em implementar os seus próprios sistemas de captura musical online para não perder o trem.

Mas porque será que elas ainda relutam em abraçar definitivamente as tecnologias da Internet como o MP3 e o Liquid Audio? Para começar, os centros de lucro da venda de música pré-gravada vão sofrer grande redução e as grandes companhias mundiais de discos são famosas por sua obesidade econômica. Basta uma olhada em um contrato artístico padrão, para se ter uma idéia dessa dimensão.

O custo de estúdio é totalmente recuperável em vários dos grandes mercados do mundo, considerado advance de royalties aos artistas. A distribuição de música é propositalmente limitada e bastante exagerada na mídia, para alavancar a carreira de determinados nomes e músicos e compositores são marginalizados no acostamento, com pouco ou nenhum poder de penetrar no fechado mundo dos superstars. Num ambiente como esse, é difícil sobressair a criatividade. Qualquer semelhança com o atual mercado musical brasileiro é mera coincidência…

O mesmo se dá com vários outros custos associados à gravação, prensagem, embalagem e entrega do produto. O próprio CD, a impressão gráfica do encarte (tray-card), a caixinha plástica que o contém e sua distribuição, tudo gera fantásticos lucros destinados a desaparecer em um mundo dominado pelo formato MP3 e seus similares. Moral da história: as gravadoras majors não estão abraçando o MP3 e a Internet pela simples razão de que esses formatos removem “gordura” dos seus balanços anuais.

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