Carta marcada

Motorista acusa CPI do narcotráfico de suborno

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14 de dezembro de 1999, 23h00

O motorista Adilson Frederico Dias Luz está acusando a CPI do Narcotráfico de tê-lo subornado para que ele acusasse o advogado de Campinas, Artur Eugênio Matias. A OAB-SP já comunicou o fato às corregedorias do Tribunal de Justiça e do Ministério Público de São Paulo.

O motorista encontrava-se preso em Igarapava (SP), acusado de roubo de carga de um caminhão conduzido por ele. Em depoimento gravado e registrado em escritura de declaração em um cartório de São Paulo, Dias Luz afirma que foi libertado, ganhou passagens aéreas e promessa de casa e emprego em Brasília, para incriminar o advogado que foi preso em Brasília.

O alegado suborno teria partido do deputado Celso Russomanno, que explorava um negócio de orientação jurídica por telefone (0900), fechado por ordem da OAB paulista, no ano passado.

Os deputados estavam irritados com os dirigentes da OAB-SP que, na vez anterior em que Artur Matias fora preso, recorreram ao Tribunal de Justiça e conseguiram a sua libertação. Na sentença, o desembargador Djalma Lofrano afirmou que o pedido da CPI fora fraudulento.

Com o depoimento de Dias Luz, em Igarapava, o advogado voltou para a cadeia. Um novo pedido para sua libertação está sendo apresentado pelo advogado Laerte Macedo.

A Comissão de Prerrogativas da OAB-SP, onde o motorista negou o depoimento dado em Igarapava, chegou a cogitar de denunciar os deputados Russomanno e Robson Tuma junto à Corregedoria da Câmara dos Deputados, em Brasília. Posteriormente, o secretário-geral adjunto da entidade, Orlando Maluf, negou que a OAB-SP faria a acusação, afirmando que a mesma seria apenas “encaminhada” à Câmara.

Em suas declarações perante o 17º Tabelião de Notas de São Paulo, acompanhado do presidente da Comissão de Prerrogativas da Ordem, Alberto Rollo, o motorista afirma ter implicado o advogado, Artur Eugênio Matias, em troca de sua liberdade.

O acordo teria sido proposto a Dias Luz pelo promotor de Igarapava e pelo Promotor de Campinas (SP), Ricardo Silvares. O motorista, que também esteve com os deputados da CPI, afirma que os dois promotores lhe “ensinaram” o que deveria dizer ao juiz para que pudessem acusar Matias. Depois de dar seu testemunho, Adilson foi liberado pelo juiz.

Os promotores acusados, contudo, afirmam que a mulher do advogado de Campinas, Naara Cristina Vilages, teria oferecido dinheiro ao motorista para que este alterasse seu depoimento.

A CPI também está rebatendo as acusações feitas por Naara e suspeita que ela tenha ameaçado o motorista para fazê-lo recuar de suas declarações iniciais.

Leia a íntegra do depoimento do motorista Dias Luz:

17o. Tabelião de Notas de São Paulo

E-DECLA : OAB-SP

Natureza: Escritura de declaração

Aos NOVE (09) dias do mês de DEZEMBRO (12) do ano de MIL NOVECENTOS E NOVENTA E NOVE (1999), nesta Cidade de São Paulo, Capital do Estado do mesmo nome, República Federativa do Brasil, no 17o. Tabelião de Notas, situado na Praça da Sé, no. 377 (cep 01001-00) e rua Felipe de Oliveira, no. 26, fone/fax: (011) 3107.4388, perante mim, escrevente, compareceu como outorgante declarante, ADILSON FREDERICO DIAS LUZ, brasileiro, solteiro conforme declarou, motorista, portador da cédula de identidade RG 29.498.264-4-SSP-SP, inscrito no CPF/MF sob o no. 195.594.358-33, residente e domiciliado na Cidade de Campinas – SP, na rua Marcos Teodoro, no. 243; acompanhado de sua companheira, ROSANGELA RIBEIRO RAMOS, brasileira, solteira conforme declarou, maior, auxiliar de departamento pessoal, portadora da cédula de identidade RG no. 27.950.475-5-SSP-SP, inscrita no CPF/MF sob o no. 178.883.868-81, residente e domiciliada no mesmo endereço. O presente reconhecido por mim, escrevente, como sendo o próprio de que trato, pelos documentos referidos e ora apresentados. Então, disse-me o outorgante declarante vem por esta escritura esclarecer e informar como declarado tem, de livre e espontânea vontade, sem induzimento e coação o que segue: o declarante esclarece que foi procurado no dia 25.11.1999 na Cadeia Pública de Igarapava, onde se encontrava preso pelo Delegado Dr. Pio, acompanhado por um detetive cujo nome ele não se lembra. O delegado informou ao declarante que tinha uma coisa boa para lhe propor. Retirou o declarante da cadeia e o levou até o Fórum, onde se encontrava o Promotor Dr. Rogério. Em conversa com o Promotor este lhe sugeriu que, se incriminasse o advogado Dr. Artur Eugênio Matias, no caso de roubo de carga, teria sua vida facilitada e seria liberado ainda no dia seguinte. Enquanto falava ao declarante, Promotor Dr. Rogério também ligava e se aconselhava com o Promotor de Campinas, como ficou sabendo, de nome Ricardo. Foi-lhe aconselhado que enriquecesse sua história com detalhes para facilitar o convencimento do Juiz. Ficou até pouco antes do final da novela Terra Nostra, quando foi levado de volta para a Cadeia de Igarapava. No dia seguinte, 5, 30 horas da manhã, foi acordado pelo carcereiro e avisado que às 5,50 horas iria ser levado dali pelo Delegado Dr. Pio. Às 6,00 horas chegou o Dr. Pio que levou o declarante no carro dele Delegado, para mostrar a chácara do Salvador. Ficaram nessa chácara até cerca de 10,00 horas em companhia de vários outros policiais, incluindo mais dois Delegados, quatro investigadores, um carro de polícia e vários carros particulares. Em seguida foram para o Fórum, onde deram ao declarante um pastel e um refrigerante. Em seguida, na sala do Promotor Rogério onde se encontrava, chegou o Promotor de Campinas Dr. Ricardo, sendo que ambos ficaram conversando como o declarante, preparando-o para o depoimento que se seguiria. Ensinaram ao declarante o que deveria dizer. Em seguida foram para a sala do Juiz, onde foi tomado o depoimento. O declarante complementou os fatos com o que havia assistido na televisão, respondeu às perguntas do Juiz e em seguida, respondeu ás perguntas dos dois Promotores. Já no meio do depoimento o Juiz mandou soltar as algemas do declarante, ao final do depoimento comunicou ao declarante que ele estava solto, devendo “sumir, desaparecer”. Foi levado para a Delegacia no carro do Delegado. Lá verificaram se havia mais alguma razão de prisão (DVC),e , como nada constasse, soltaram o declarante, mandando-o embora. O declarante ligou para família do Fórum, primeiro, e depois, do orelhão em frente a Delegacia, sendo que a família foi buscá-lo quatro horas depois, chegando por volta da meia noite. Assim o declarante veio embora com a família. Na semana seguinte, na Segunda-feira, como combinado, ligou para o Promotor Ricardo que pediu fosse ele ao seu encontro na Terça-feira, às 13,30 horas. O declarante, na Terça-feira, foi ao encontro do Promotor Ricardo, na hora aprazada, sozinho. Ficou no gabinete do Promotor, na Nova Campinas, Promotoria do Estado, até 16,00 horas, quando chegaram os Deputados Robson Tuma e Celso Russomano que ficaram conversando com o declarante das 16,00 horas até cerca de 18,00 horas. Os deputados disseram ao declarante que o mesmo iria receber ameaças e que os procurassem, deixando telefones para contato. O declarante recebeu do deputado Robson Tuma a importância de R$ 50,00 (cinqüenta reais) para o táxi. O declarante foi embora de táxi. No mesmo dia, ao chegar em casa, o declarante se deu conta das notícias de jornal e receoso, já no Sábado e na Segunda-feira feira seguintes, o declarante ligou para Celso Russomano pedindo proteção conforme prometido. O Deputado Russomano mandou que ligasse mais tarde. Quando o declarante ligou, o Deputado Russomano havia providenciado passagens aéreas pela Rio-Sul, vôos 337/ e outro, em conexão, desde Viracopos até Brasília, para o dia de 8 de dezembro, deixando Viracopos às 17,01 horas e desembarcando às 20,27 horas em Brasília, onde o Deputado Russomano iria acomodá-lo em uma casa alugada como disse, e arranjaria um emprego para o declarante. As passagens eram para o declarante e sua companheira, aqui presente Rosangela Ribeiro Ramos. O declarante não compareceu para o embarque, embora tivesse preparado suas malas. O primo de sua companheira Rosangela Ribeiro Ramos no dia 8 de dezembro de 1999 de nome Ricardo, apareceu na casa deles e conversou meia hora com o declarante, convencendo-o a dizer a verdade. Em seguida o declarante foi encontrar a esposa do Dr. Matias, com quem conversou mais meia hora. A esposa do Dr. Matias chamou o advogado Dr. Laertes Torrens, que o trouxe a São Paulo. No caminho o Dr. Laertes fez os contatos para irem todos a Praça da Sé, sede da O.A.B. – São Paulo. Como foi informado que a OAB estava fechada, todos lá se encontraram, na porta da OAB e de lá, vieram para o escritório de Dr. Alberto Lopes Mendes Rollo. O declarante informa que concedeu no dia 6 de dezembro, duas entrevistas para o Diário do Povo e Correio Popular. Ficou sabendo que apareceram três entrevistas, uma das quais foi ditada pelo Celso Russomano. Nenhuma das entrevistas publicadas correspondem ao que o declarante falou. Hoje não concedeu nenhuma entrevista. Esclarece, finalmente, ele declarante que o Dr. Artur Eugênio Matias, pelo que o declarante saiba, não tem qualquer participação no roubo de carga referente ao processo que o declarante responde perante Juízo de Igarapava. Que, o declarante ficou conhecendo o Dr. Artur porque o mesmo havia prestado serviços profissionais e continua prestando, para sua sogra, em processo de pensão alimentícia e para sua companheira, em processo trabalhista, advindo daí o fato do Dr. Artur ter sido contratado para defender o declarante no processo crime já referenciado. Esclarece mais o declarante que a presente escritura de declaração ratifica seu termo de declarações prestado, em data de 08 de dezembro do corrente ano perante o Presidente da Comissão de Prerrogativas e perante o Corregedor da Comissão de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil – Secção São Paulo. Nada tendo mais a declarar, pediu-me lhes que lavrasse a presente escritura de declaração, a qual feita, lida, outorgou e assina em presença de Dr. ALBERTO LOPES MENDES ROLLO, brasileiro, advogado, OAB/SP 020893 e Dr. RAUL HUSNI HAIDAR, brasileiro, advogado, OAB/SP 030769, com endereço na Praça da Sé, no. 385, e que assinam com ele declarante. Eu, MARIO FERRARI, Escrevente, a escrevi. – Eu, CLÚADIO ALGUSTO GAZETO, Escrevente Autorizado, a subscrevi. – (a.a.) ADILSON FREDERICO DIAS LUIZ – ROSANGELA RIBEIRO RAMOS – DR. ALBERTO LOPES MENDEZ ROLLO. – DR. RAUL HUSNI HAIDAR. – (DEBIDAMENTE SELADA). – NADA MAIS. – TRASLADA EM SEGUIDA.

CLAUDIO AUGUSTO GAZETO

ESCREVENTE AUTORIZADO

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