Os Reflexos da Reforma Tributá

Qual a validade do CTN após a Ref.Tributária?

Autor

16 de agosto de 1999, 0h00

OS REFLEXOS DA REFORMA TRIBUTÁRIA NO CTN

Cecília Teixeira de Souza Oliveira*

Na conjuntura em que o Brasil se encontra, vale dizer, num contexto histórico em que diversas Emendas Constitucionais alteram a Constituição Federal de 1988, mais que oportuno, é natural o surgimento da seguinte dúvida : como se encontrará o CTN depois que uma iminente Emenda Constitucional realizar a chamada “Reforma Tributária”?

Como não nos é dado o dom de profetizar, estando o projeto da referida Emenda Constitucional ainda tramitando no âmbito do Poder Legislativo, o que significa a passibilidade de mudanças, cabe-nos apenas, ao menos nesse momento, tecer comentários acerca de como remanescerá a validade do CTN após a Reforma Tributária. Constituindo-se, a validade, segundo EDISON CARLOS FERNANDES*1., na “capacidade em tese de resolver conflitos”, o que se vai perquirir neste artigo é a possibilidade de o Código Tributário Nacional, mesmo em seguida a uma Emenda Constitucional reformadora da ordem tributária, ainda ser aplicável às diversas situações apresentadas pela realidade fática.

Liminarmente, cumpre-se pontuar que a Reforma Tributária, ora em trâmite no Congresso Nacional, não se confunde com uma Revisão Constitucional.

A Revisão Constitucional, modificação ampla no corpo da Constituição, de acordo com a Carta Magna vigente (art. 3º ADCT), realizar-se-ia “após cinco anos contados da promulgação da Constituição, pelo voto da maioria absoluta dos membros da Congresso Nacional, em sessão unicameral.” Ora, reproduzindo-se as palavras do mestre JOSÉ AFONSO DA SILVA, “não cabe mais falar em revisão constitucional. A revisão terminou e não há como revivê-la legitimamente. Agora só existe o processo das emendas do art. 60.”*2.(grifos nossos)

Destarte, apesar de as modificações no texto constitucional recentemente empreendidas (a exemplo da Reforma Administrativa e da Reforma Previdenciária, veiculadas, respectivamente, pelas Emendas Constitucionais nºs. 19 e 20) serem denominadas reformas, sua natureza jurídica é de Emenda Constitucional. Alterando de maneira pontual vários artigos da Constituição, a Emenda Constitucional que introduzir modificações no Título da Tributação e do Orçamento, bem como em outros dispositivos a ele atinentes, submeter-se-á ao artigo 60 da CF/88, principal e inquestionavelmente, saliente-se, no que concerne às limitações materiais, temporais, circunstanciais e formais previstas nos seus parágrafos.

Atendendo, a multimencionada Emenda Constitucional reformadora da ordem tributária, às lindes retro aludidas, suas disposições ingressam no Ordenamento Jurídico Pátrio com o status de norma constitucional.

Tendo se estabelecido qual o grau hierárquico da Emenda Constitucional sob exame, mostra-se pertinente analisar o lugar ocupado pelo CTN na pirâmide do Ordenamento Jurídico para, por fim, se verificar a possibilidade ou a impossibilidade de derrogação total ou parcial deste Código por aquela Emenda Constitucional.

A Constituição Federal, no seu artigo 146, reserva à lei complementar o mister, dentre outros, de “estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre : a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos dispostos nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes; b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários”. Só nos exemplos ora reproduzidos, constantes do artigo invocado, já se verifica que o CTN versa sobre matéria de Lei Complementar.

Apesar de ter sido promulgado em 1966 simplesmente como Lei (Lei nº 5.172), por dispor acerca dos temas reservados à Lei Complementar, quando do advento da atual Carta Magna (1988), ele foi recepcionado, no que não conflitasse com a Constituição, como Lei Complementar. Nesse sentido, espanca qualquer dúvida que por ventura permaneça, os brilhantes ensinamentos de HUGO DE BRITO MACHADO :

“o Código Tributário Nacional trata de matéria reservada às leis complementares. Por isso há de ser considerado uma lei complementar. Não tem esse nome porque na época em que foi votado a Constituição Federal não fazia a distinção hoje adotada. Hoje, porém, estando a matéria de que se ocupa reservada às leis complementares, não pode o Código Tributário Nacional ser modificado ou revogado por lei ordinária. Não é que o Código Tributário Nacional tenha passado a ser lei complementar. É que somente a lei complementar pode tratar, atualmente, da matéria constante daquele Código.”* 3.

Também com base na Jurisprudência (vide citação de ALIOMAR BALEEIRO infra transcrita), constata-se a irrefutabilidade da natureza jurídica de Lei Complementar emprestada ao CTN.

“Certo é que, pacificamente, dezenas e dezenas de Acórdãos do S.T.F. aplicam o CTN como lei complementar.”*4.

Deve-se, portanto, tendo em vista o retro e supra exposto, concluir que o CTN pode ser derrogado pela Emenda Constitucional da Reforma Tributária, respeitando-se, entretanto, os direitos e garantias constitucionais que dentre os seus dispositivos se vislumbre. Sendo considerado, hierarquicamente, o CTN, como Lei Complementar, e ingressando no Ordenamento Jurídico, a E.C. reformadora do ordem tributária, com status de norma constitucional, é evidente a possibilidade desta emenda revogar dispositivos daquele Código. Logo, respeitando-se os limites materiais impingidos ao poder de emendar a constituição (cf. art. 60 § 4º, CF/88), é plenamente cabível a alteração de todos os demais dispositivos constantes do CTN pela Emenda Constitucional a ser editada brevemente, sendo aplicável esse mesmo CTN apenas no que não tiver sido objeto de derrogação pela multialudida Emenda Constitucional.

______

* Advogada, Aluna Laureada pela Universidade Federal da Bahia.

*1.FERNANDES, Edison Carlos. Tributação no Mercosul. In :MARTINS, Ives Gandra da Silva – coord. Tributação no Mercosul.São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p.342-58 (Pesquisas Tributária – Nova Série – 3).

*2.SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, 15ªed. São Paulo: Malheiros,1998, p.68.

*3.MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 14ªed. São Paulo: Malheiros, 1998, p.57.

*4.BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro, 9ªed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1977, p.59.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!