O FMI vai ter de esperar

Pacote I: Juristas contestam uso de MP

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27 de outubro de 1998, 23h00

Ainda que o governo tenha sucesso com suas propostas anti-crise no Legislativo, suas chances no Judiciário são pequenas. Esse é o entendimento dos primeiros advogados a se manifestarem sobre o rol de iniciativas propostas pelo governo.

O advogado Roberto Pasqualin, presidente do Comitê de Legislação da Câmara Americana de Comércio, também alerta para a necessidade de Emenda Constitucional para alterar a alíquota do “imposto do cheque”. Além da questão legal, ele chama atenção para a postura do governo, que quer moldar a Constituição para resolver problemas de ordem financeira. “É uma afronta a facilidade com que se muda a Constituição, que tem apenas dez anos e já foi emendada 19 vezes”, afirmou Pasqualin.

Outra medida anunciada pelo Governo é o aumento de 1 ponto percentual na Cofins. Atualmente a alíquota da contribuição é de 2% e incide sobre o faturamento das empresas. Segundo a proposta, esse aumento da alíquota poderá ser deduzido do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ). Também aqui, na visão dos advogados consultados, o governo terá problemas para a efetivação da medida. “A compensação da Cofins com o IRPJ traz em si um grande problema uma vez que o primeiro é contribuição social (o governo tem obrigação de oferecer algo em troca, no caso financiar a seguridade social), o segundo é imposto (basta a auferição de renda líquida). Trata-se, portanto, de tributos totalmente distintos, no que parece não acreditar o governo”, compara Diamantino.

Para Djalma Cristiano Gomes Filho, diretor da área de tributos da Trevisan Consultoria, o governo não explicou qual será a situação das empresas que registrarem prejuízo no período. “O governo precisa definir se a antecipação da Cofins será definitiva ou se, em caso de prejuízo, as empresas poderão descontar a antecipação no pagamento de outras contribuições”.

Outra intenção anunciada, a de atribuir à Justiça do Trabalho a competência para cobrar contribuições sociais sobre folha de salários é descrita por Piza Fontes como “inaceitável”. Essa idéia colide de frente com as disposições constitucionais que fixam o papel e as atribuições da Justiça. Para ele, seria “um absurdo transformar um ramo do Judiciário em órgão arrecadador”.

Propostas como a incorporação dos depósitos judiciais ao Tesouro Nacional são consideradas inviáveis. “O depósito fica à disposição do Juízo e não de uma das partes”, afirma o advogado João Roberto Piza Fontes. “Seria insólito o cidadão vencer a causa e depois ter que entrar na fila dos precatórios para receber seu dinheiro de volta”.

A proposta de prorrogar e elevar a alíquota da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) de 0,25% para 0,38% em 1999 e 0,30% em 2000 e 2001, também foi criticada por Eduardo Diamantino. “As alterações na alíquota da CPMF para acima do máximo permitido no artigo 74 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, só pode se dar mediante Emenda Constitucional, jamais por Medida Provisória”, alerta o advogado do escritório Diamantino – Advogados Associados.

Diz o parágrafo 1º do artigo 74 da ADCT: “A alíquota da contribuição de que trata este artigo, não excederá a vinte e cinco centésimos por cento, facultado ao poder executivo reduzi-la ou restabelecê-la, total ou parcialmente, nas condições e limites fixados em lei”.

Como instrumento para uma eventual batalha jurídica, os advogados já têm uma arma na mão: o livro de cabeceira dos ministros de tribunais superiores, organizado pelo Superior Tribunal – “A Constituição na visão dos Tribunais” – onde se reproduz uma tese importante do constitucionalista e atual presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer: alíquotas de tributos só podem ser alteradas por lei ordinária, jamais por Medida Provisória.

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