Município

O problema da implantação da Agenda 21 nos municípios brasileiros e so

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  • José Souto Tostes

    é ex-procurador municipal ministrante de cursos na área de licitações e direito público articulista e autor do blog "Artigos" onde publica textos comentando a legislação brasileira e decisões da Justiça. Atualmente é advogado na área de licitações representando empresas que atuam no mercado de fornecimento ao Poder Público além de prestar consultoria para municípios e Câmaras Municipais.

10 de março de 1998, 0h00

Município : Sustentabilidade e Desenvolvimento

*José Souto Tostes

O Social: A questão do desenvolvimento sustentável, por uma análise inicial, parece-nos atinente, só e tão somente, às questões de meio-ambiente e da forma como conseguiremos “experimentar e disseminar novas formas de progresso econômico que não destruam os ecossistemas e o habitat social (cidade, vilas, bairros, famílias, etc) e que melhorem a qualidade de vida do planeta”, como faz referência a Dra. Ana Lucia Nadalutti La Rovere, em artigo publicado na revista do TCMRJ sob o título “Uma agenda a cumprir”, referindo-se ao fato de que ” a agenda 21 é um importante passo em direção ao desenvolvimento sustentável”.

Porém, em outro tópico importante do mesmo artigo, mas que não ganha acentuação maior, a autora afirma que “a procura por um desenvolvimento sustentável aponta para soluções que busquem contemplar os problemas ambientais e sociais de forma integrada”. Aí sim, há um destaque que tomaremos por base para afirmar que os problemas sociais são de extrema importância na análise de um planejamento em torno do desenvolvimento sustentável. Sem a análise desse problema crucial, não há como adentrarmos numa discussão aprofundada sobre o tema. Um assunto não pode ser tratado apartado do outro, é questão de causa e efeito, onde, também, deve ser acrescida a discussão em torno da questão da distribuição de verbas arrecadadas pelo governo federal por intermédio de seus diversos impostos e das multas aplicadas no caso de infrações de todo tipo e etc..

A reorganização dos municípios e a implantação dos mecanismos de controle da administração, efetivamente, também são pontos importantes nessa consideração. A reforma administrativa tem nexo com esta questão por que as folhas de pagamento – não os quadros de funcionários – estão inchadas e são desses recursos que os municípios tanto necessitam para implantar um programa real e definitivo de sustentabilidade geral.

Os Estados: Documento do chamado Projeto Áridas, em desenvolvimento no Nordeste, expressa o seguinte: “Até agosto de 1995, seis Estados do Nordeste já haviam preparado ou estavam preparando Planos Estaduais de Desenvolvimento Sustentável”… “Todos incorporam elementos centrais da metodologia Áridas: a busca de sustentabilidade econômica, social, ambiental e política; o uso de cenários tendenciais e desejados; a análise de vulnerabilidade; o processo participativo”. Aqui já há um destaque à presença do Estado no desenvolvimento de projetos desse porte. O município não dispõe de todos os mecanismos do Estado, são as Universidades, os centros de pesquisa e o próprio poder de barganhar com grandes instituições.

A Sociedade: O caso em tela reflete, inclusive, esse pensamento, pois conta com a participação de órgãos e entidades do porte do Banco Mundial, do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA), o Centro de Estudos Avançados de Houston (Harc), o Instituto Recursos para o Futuro (IFF), o Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), só para citar em termos de participação internacional. Destaca o mesmo documento a participação de entidades não-governamentais, asseverando: “que todas as instituições participaram voluntariamente.” Essas informações são do IPEA, assinadas pelo Coordenador Geral do Projeto Áridas, Antonio Rocha Magalhães e pelo coordenador técnico do mesmo projeto, Ricardo Roberto de Araújo Lima. E só fazem somar e destacar que o processo de implantação do planejamento para a sustentabilidade passa pelos mecanismos de fusão de forças – públicas ou não – em prol de um objetivo maior que é nossa manutenção como espécie e ser vivente do planeta.

O Governo Federal e suas Ações: Fato importante também deve ser destacado da ata da primeira reunião da Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável e da Agenda 21 Brasileira, realizada no Ministério do Planejamento e Orçamento, no dia 11 de junho de 1997. Nesta data o Ministro Antonio Kandir, do Planejamento, anunciou que “tanto o Programa “Brasil em Ação” quanto o “Plano Plurianual 2000″ serão concebidos com os critérios de sustentabilidade da Agenda 21 a ser elaborada com participação da sociedade civil”. Ao definir os objetivos dessa comissão, disse o ministro, que a Comissão ” tem a função catalisadora de acelerar os compromissos com o desenvolvimento sustentável e as ações correspondentes dentro do máximo de pragmatismo”.

Na mesma reunião, o Ministro do Meio Ambiente, Gustavo Krause enfatizou o conceito de sustentabilidade, ” como um conceito de ruptura e de passagem de um velho para um novo paradigma, que abandona as políticas setoriais em favor de uma visão interdisciplinar e transectorial. Para o Ministro só são sustentáveis as sociedades democráticas, eficientes e equânimes. Enfatizou a sustentabilidade econômica e a estabilidade da moeda como condições para as demais modalidades de sustentabilidade”.

Nesse mesmo fórum , o Secretário-Executivo da Câmara de Políticas Sociais da Presidência da República, Vilmar Faria, destacou os eixos em que se estruturará a estratégia de implantação do desenvolvimento sustentável no Brasil, que são os seguintes:

“1) Reconhecimento de que a estabilidade macroeconômica é a pré-condição para ganhos sociais reais;

2) Estabelecimento de políticas capazes de produzir mais e melhores postos de trabalho e melhora do ensino básico;

3) Reformulação do padrão gerencial dos serviços básicos na área social implicando reverter a herança assistencialista e dando-lhe um caráter distributivo;

4) Articulação de políticas (novas formas de assentamento, colonização, política agrícola para a pequena produção, etc);

5) Aproximação às questões emergenciais através do Programa Comunidade Solidária cobrindo os 1000 municípios com maiores graus de carência”.

O Encaminhamento inicial, os trabalhos pela Agenda 21 Brasileira :A Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável e Agenda 21 Nacional, em reunião realizada no último dia 16 de dezembro, aprovou o documento denominado “Agenda 21 Brasileira : Metodologia e Roteiro de Trabalho”, contendo as orientações e os passos que serão seguidos para a implantação de nossa Agenda 21 e das Agendas locais. Destaque nesse trabalho é sua parte introdutória, que afirma:

“Em consonância com a Agenda 21 Global, a Agenda 21 Brasileira deve ser a expressão de um projeto de desenvolvimento sustentável, que viabilize, em simultâneo, a conservação e qualidade ambiental, o tratamento equânime e justo na distribuição da riqueza nacional e a busca permanente do crescimento e da eficiência econômica e da participação democrática. Deve, além disso, ser o resultado de um planejamento participativo, em que as prioridades nacionais e locais sejam definidas e executadas em parcerias, constituindo-se num roteiro para a ação, na qual os interesses sociais envolvidos se sintam comprometidos.”

O mesmo documento ainda traça os principais temas para a elaboração da Agenda 21 Brasileira, quais sejam: cidades sustentáveis, agricultura sustentável, infra-estrutura e integração regional, gestão dos recursos naturais, redução das desigualdades sociais e desenvolvimento científico e tecnológico.

Este trabalho já é uma garantia para todos nós, no sentido de que a discussão em torno da sustentabilidade vai girar na discussão mais ampla possível, permitindo alicerçar todos os problemas sociais, de economia, incluídos, com certeza, a questão básica: evoluir sem destruir. Promovendo, com isso, uma volta à discussão inicial da ecologia, dentro dos aspectos e ensinamentos da Hipótese Gaia, que questiona a relação da vida com as condições atmosféricas e climáticas, conceituadas por Leclerc e Humboldt, e afirmam que a própria vida cria condições necessárias para manter-se criando novas condições de equilíbrio quando situações de desequilibrio ameaçam a vida, como se o planeta fosse um organismo vivo e inteligente. E é nessa discussão que estamos no momento, ou seja, como nos desenvolvermos, implantando indústrias, urbanizando nossas metrópolis e termos esperança de vida no próximo milênio para nossos filhos, netos, bisnetos e etc..

Com certeza, o que estamos discutindo hoje nos valerá daqui há alguns anos, pois o presente de destruição e degradação já virou fumaça, mostrou-nos o fogo (onde há fumaça há fogo), cabe, à nossa geração, localizar o fogo, para que as próximas apaguem.

Os Municípios: Já a questão local, dos municípios, pequenos, médios e grandes, merece uma reflexão aprofundada sobre os aspectos e nuances da atual, das futuras e das antigas administrações municipais. Não há que se falar em administração A ou B que ocupa o mandato 97/2000, muito ao contrário, temos que colher e discutir sementes já brotadas, temos que planejar para o amanhã, usando estes fóruns que se abrem, interagindo com o futuro e o que queremos dele. São questões locais de desenvolvimento, a industrialização, os problemas de esgoto, de água, de desmatamento, de queimadas, rios, lagos, nascentes, das águas subterrâneas e outros problemas que o desenvolvimento desenfreado pode ocasionar.

E o município ganha destaque na Agenda 21, onde, em certo trecho do capítulo 28, está expresso, com referência à atuação municipal: “Como nível de governo mais próximo da população, desempenham um papel essencial na educação, mobilização e resposta ao público, em favor de um desenvolvimento sustentável.”

Aí entra a questão da legislação local, que, em consonância com a Constituição Federal e com as constituições estaduais, deve estar preparada para todos os desafios advindos com esses problemas. Importante destacar o papel de policiamento – exercício do poder de polícia – por parte dos municípios que estão implantando políticas de controle do desenvolvimento, ou seja, controle das indústrias poluentes, acompanhamento do processo de industrialização, mecanização; enfim, todas as questões que surgirem relacionadas ao processo de desenvolvimento, devem ser abordadas com o uso da força do poder de polícia (fiscalizatório), único mecanismo disponível para tratar questões dessa modalidade .

Finalmente: Na verdade, o homem sempre discute isso – seu contato com a natureza e a degradação ambiental – são problemas inerentes à própria existência e que foram questionados por todas as gerações que nos antecederam. Na verdade, hoje, com o avanço tecnológico, o desenvolvimento se dá com muito mais força, com muito mais intensidade e o homem vive em constante mutação, buscando o aperfeiçoamento, o desenvolvimento de suas habilidades na constante guerra para manter-se vivo nesse planeta outrora totalmente desconhecido. Planeta onde as forças da natureza – muitas, imprevisíveis – atuam contra as forças do ser inteligente, formando o ciclo da vida.

Estamos preparados para enfrentar estas questões ? Temos dado a esses problemas a importância devida ? Obras ? Redes de esgoto ? Água (questão de grande importância) !

Enfim, temos que estar preparados para o futuro. Precisamos localizar os incêndios, indentificá-los e contarmos com a próxima geração ( que prepararemos nas escolas – lei 6938/81 e como definiu o Sisnama – Sistema Nacional de Meio Ambiente). São desafios ? São. Estamos preparados para enfrentá-los ? Não. Estaremos a tempo ? Cremos que sim. “Pois a própria vida criará as condições necessárias para manter-se” (Hipótese Gaia).

· José Souto Tostes é advogado, especializado em Direito Administrativo e atual Secretário Municipal de Planejamento de Araruama-RJ.

· Este artigo usa informações das obras já citadas, que são as seguintes:

· Revista do TCMRJ – Controle Ambiental – Municípios reúnem instrumentos para entrar em ação – Uma agenda a cumprir – Ana Lucia Nadalutti La Rovere

· Ipea-Temas Especiais – Aridas – Nordeste: Uma estratégia de desenvolvimento sustentável, Brasília, outubro de 1995 – Antonio Rocha Magalhães-Coordenador Geral do Projeto Áridas – Ricardo Roberto de Araújo Lima-Coordenador Técnico do Projeto Áridas

· Ata da Primeira Reunião da Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável e da Agenda 21 Brasileira, 11 de junho de 1997

· Página Eco Site da Internet (http:// www.terravista.pt/fernoronha/1742/ecosite.htm) 25/02/98

· Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável e da Agenda 21 Nacional, documento “Agenda 21 Brasileira: Metodologia e Roteiro de Trabalho – Quinta versão (16/12/1997)

· Resumo do Temário da Agenda 21 – apanhado dos pontos principais abordados pela Agenda 21-Resumo/ONU, que sumariza os resultados da Conferência das Nações Unidas Sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento – Cúpula da Terra, realizada no Rio de Janeiro, de 3 a 14 de junho de 1992.

· O texto data de 02 de março de 1998.

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