TJ rebate críticas de FHC

Judiciário paulista rebate as críticas presidenciais

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3 de agosto de 1998, 0h00

Na última quinta-feira o presidente Fernando Henrique Cardoso teceu duras críticas ao Judiciário, fez apologia às defensorias públicas e apontou defeitos que generalizam as construções que abrigam os serviços forenses. A resposta paulista veio, nesta segunda-feira, através do próprio presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Dirceu de Mello.

Na palestra que proferiu na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), FHC afirmou que “percebe-se uma sede de justiça, que corta a sociedade de alto a baixo”. O Presidente da República – além de defender a reforma do Judiciário – criticou o uso de recursos para a construção de prédios sofisticados. “Eu viajo de helicóptero por aqui; há muito prédio grande feito, no Brasil todo, pelos tribunais. Será que esse é o melhor destino para os recursos? Não daria para criar as defensorias públicas em vez de criar palácios?”

Leia a íntegra da resposta do Judiciário paulista (a ser publicada no D.O.E. amanhã):

Carta aberta, dirigida pelo Presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Desembargador Dirceu de Mello, ao Excelentíssimo Senhor Presidente da República Federativa do Brasil, Doutor Fernando Henrique Cardoso

São Paulo, 31 de julho de 1998.

Excelentíssimo Senhor Presidente da República Federativa do Brasil, Doutor Fernando Henrique Cardoso

Tão perplexo como, não faz muito, ouvi Vossa Excelência, indistintamente, chamar de vagabundos os servidores públicos aposentados do país, vi-o agora, pela televisão e em palestra proferida na sede da Ordem dos Advogados do Brasil, em Brasília, afirmar que, sobrevoando o território nacional, tem divisado os palácios do Poder Judiciário, já construídos ou em fase de construção.

O lapso do eminente Presidente – permita-me, com todo o respeito, proclamá-lo -, esteve, mais uma vez, na generalização da afirmativa. Porque em São Paulo, decididamente – e Vossa Excelência, que sempre viveu entre nós, por certo haverá de conhecer as condições locais -, os prédios do Judiciário estadual, com construção e conservação a cargo do Poder Executivo do Estado, modestos e sóbrios, bem longe estão de sugerir os palácios aventados na fala presidencial.

Digo-o mais: em muitas comarcas do interior, por força das necessidades, Juízos e Varas funcionam precariamente em acomodações provisórias, locadas ou mesmo cedidas pelas Prefeituras interessadas.

A coragem e a decência dos governantes – qualidades que não faltam a Vossa Excelência – estão não apenas em apontar desacertos ou abusos, mas, sobretudo quando em causa a autoridade de outros Poderes, nomear claramente os responsáveis. Até para que possam, como acontece com qualquer cidadão, prestar contas de seus atos.

Sentindo que o pronunciamento presidencial considerado atingiu injustamente o Poder Judiciário de São Paulo, é que me permiti, Senhor Presidente, sempre com o maior acatamento, endereçar-lhe esta carta.

Faço-o, insisto, em nome da Justiça do Estado, cujos destinos, pelo prazo do mandato que me foi conferido por meus pares, tenho a honra de dirigir. Faço-o, outrossim, convencido de que Vossa Excelência, democrata e estadista, haverá de compreender protestos que, longe de afrontar o Presidente de todos os brasileiros, tem como objetivo resguardar a dignidade de segmento do Judiciário nacional que, como outros, se viu indevidamente atingido por admoestação genérica e inominada, por isso passível de repulsa.

Pessoalmente, Senhor Presidente, continuo seu admirador. Reservando-me, porém, o direito de respeitosamente contestá-lo, toda vez que, enquanto Chefe do Poder Judiciário de São Paulo, tiver que falar em nome de meus colegas e da Justiça de Piratininga.

Com a nota de que, para conhecimento dos paulistas e dos brasileiros dos demais Estados, farei divulgar esta carta, cumprimento-o atenciosamente.

Dirceu de Mello

Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

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