Palavra mal dita

Precatório - Palavra mal dita

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29 de julho de 1997, 0h00

“Precatório” – do Latim, “deprecare”, que significa “pedir”, “requisitar” – é uma das palavras que o vernáculo destinou, através dos tempos, ao uso eminente-mente jurídico. Ela define um instrumento jurídico de grande utilidade para acertos de contas financeiras entre o Estado e os cidadãos (ou suas empresas). Para um cidadão que só consegue receber o que o Estado lhe deve – pensões alimentícias, por exemplo – através de precatório judicial, esta é uma palavra bendita.

No entanto, os recentes acontecimentos políticos em torno da malversação de títulos públicos, teoricamente destinados ao pagamento de precatórios, provocou a execração da palavra, em termos populares. O “escândalo dos precatórios”, como a mídia denominou o episódio da emissão irregular de títulos por gover-nantes estaduais e municipais de peso, fez com que mais esse fragmento do vernáculo passasse a cheirar mal. Ouve-se a palavra “precatório” até em con-versas de criança. Ela passou a soar como palavrão.

É caso típico de difamação. O precatório, como mecanismo jurídico, pode exer-cer relevante papel no restabelecimento da justiça social em inúmeras situações em que o Estado é a parte mais forte. Pode ser uma via de solução para pro-blemas nacionais de grande envergadura, relacionados com a reforma agrária, as intervenções em Estados e Municípios, a dívida fiscal e previdenciária, a ina-dimplência e insolvência das Estatais, o desafogo do Judiciário e outros.

Proposta

Em vez de difamado e desmoralizado, esse instrumento jurídico deveria ser mais desenvolvido, de forma a se ampliar a sua expressão como mecanismo de defe-sa dos interesses da população. Sob esse aspecto, propomos a criação da “Câ-mara Nacional de Compensação de Títulos Precatórios”. Por mais que isso pos-sa parecer complicado, seria, na verdade, um excelente mecanismo de simplifi-cação das contas públicas, com evidentes benefícios para a população e para o Estado. Uma forma simples de acerto de contas entre devedores e credores. Vejamos um exemplo:

A dívida do “Cidadão A” para com o INSS está em R$ 500 mil (somadas as con-tribuições dos empregados não recolhidas, multas, correção monetária, juros, custas judiciais e honorários advocatícios). Ele está sob ameaça de perder sua empresa e até de acabar na prisão. O “Cidadão A” decide vender a empresa.

Herdeiros do “Cidadão B” vêem nisso uma boa oportunidade de negócio e so-nham receber pelo menos uma parte do que o INSS lhes deve em pensões – bem mais de R$ 500 mil. Mas o Estado é mau pagador e não dá para contar com esse dinheiro.

Com uma “Câmara Nacional de Compensação de Títulos Precatórios”, tudo que o “Cidadão A” e os herdeiros do “Cidadão B” teriam de fazer seria comparecer ao órgão e oficializar um acordo que resultaria em uma operação triangular de pagamentos de débitos e recebimento de créditos. Todos se livrariam de seus problemas, inclusive o INSS.

De uma maneira geral, todos os órgãos públicos são credores e devedores, que não recebem seus créditos e não pagam os seus débitos. A criação da “Câmara Nacional de Compensação de Títulos Precatórios” seria a solução para regulari-zar seus sistemas financeiros.

Os “Títulos da Dívida Agrária – TDAs” também poderiam ser usados para com-pensação de débitos e créditos. Suponha-se, por exemplo, que o “Cidadão A” tenha débitos junto ao INSS e os herdeiros do “Cidadão B” tenham créditos con-tra o Incra. Os débitos e créditos poderiam ser compensados nessa Câmara, o que permitira também ao Incra quitar eventuais débitos para com o INSS.

Essa seria uma fórmula que, baseada na boa utilização do instrumento do pre-catório, ajudaria a regularizar as contas dos órgãos públicos e evitaria grandes dissabores aos cidadãos.

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