Na ordem tributária brasileira

Imposto sobre grandes fortunas e injustiça tributária

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22 de dezembro de 1997, 23h00

NA ORDEM TRIBUTÁRIA BRASILEIRA, A CORDA SEMPRE ARREBENTA DO LADO MAIS FRACO

A Constituição da República Federativa do Brasil estabelece como de competência da União, a instituição de Impostos Sobre Grandes Fortunas. Foi essa a pretensão de nosso Poder Constituinte Originário:

“Art. 153- Compete à União instituir impostos sobre:

VII- grandes fortunas, nos termos de lei complementar”.

Nossa Carta Magna foi promulgada pelo Congresso Constituinte em 05 de outubro de 1988. Até o presente momento, por mais incrível que possa parecer, o Brasil ainda não possui legislação complementar tratando do assunto. São quase dez anos de inércia de nosso Poder Legislativo Federal.

A falta de norma instituidora do Imposto Sobre Grandes produz graves distúrbios nas contas públicas, pois o Estado deixa de arrecadar os frutos provenientes deste tributo já autorizado constitucionalmente.

Quem é que o Congresso Nacional deseja proteger ao omitir-se na instituição de tal imposto? Por quê os quatro presidentes que tivemos daquela época para cá (Sarney, Collor, Itamar e FHC) não se preocuparam com o aumento que a arrecadação da União alcançaria através da tributação das grandes fortunas?

Para entender as respostas, basta atentarmos para o curso da história no Brasil.

Primeiramente, a Coroa Portuguesa distribuiu vastas terras aos seus protegidos com a instituição das Capitanias Hereditárias, ao invés de distribuir as porções coloniais de ocupação àqueles que quisessem produzir, e tal fato histórico constitui-se na primeira prova de proteção ao acúmulo desmedido de riquezas em detrimento da massa popular.

Na época da produção em escala mundial de cana de açúcar, todo o lucro ficou com a Metrópole, nada restando para ser aplicado no desenvolvimento da Colônia. Mais uma vez, a grande maioria ficou privada das benfeitorias que o comércio da cana poderia proporcionar aqui.

Quando Minas Gerais produziu quantidades imensas de ouro, tanto o metal quanto o tributo incidente foram enviados para fora de nossas fronteiras, não tendo havido tampouco investimento para o crescimento local.

E os séculos foram passando, passando, no entanto, a cultura de exploração das Capitanias Hereditárias continuou no Brasil. Foi sendo criado assim o imenso desnível social que infelizmente caracteriza nosso país como o Estado que pior distribui seus bens e rendas. Os ricos, cada vez mais ricos, e os pobres, cada vez mais pobres.

Há poucas semanas, para enfrentar a crise proporcionada pela queda vertiginosa nas Bolsas de Valores dos países conhecidos como Tigres Asiáticos, o Governo Federal baixou um “pacote” que teve como características: 1- a majoração do Imposto de Renda para a Pessoa Física; 2- o aumento dos juros e; 3- o corte de incentivos e subsídios fiscais, penalizando pequenos e médios empresários e produtores.

A história se repete. As últimas medidas do Governo Federal não atingem os grandes trustes privados que têm o Brasil como verdadeira “mina de ouro” por causa de seus juros altíssimos.

Novamente, quem vai pagar a conta vai ser o assalariado, aquele que tem o Imposto de Renda descontado na fonte e que, por isso, não tem como sonegar. Os pequenos e médios produtores rurais e empresários também sentirão o peso das medidas econômicas através do aumento, já notado, de falências e pedidos de concordata.

Ninguém se nega a fazer sacrifícios para ter um Brasil mais desenvolvido, mas por quê o ônus sempre tem de ficar a cargo do economicamente mais fraco?

Para aumentar a arrecadação e manter o Real, o Governo Federal tinha e ainda tem em suas mãos armas poderosíssimas que sacrificariam menos a população. A primeira é a criação do Imposto Sobre Grandes Fortunas que, sem dúvida, diminuiria o “gap” social existente no Brasil e encheria os bolsos do governo de fundos jamais vistos pelo Estado brasileiro. A segunda é a cobrança imediata de todos os créditos que União, Estados e Municípios têm para com seus devedores. A terceira, é a tributação do investimento especulativo estrangeiro que aplica nas bolsas de São Paulo e do Rio de Janeiro, ganha mundos e fundos, e depois vai embora.

Apesar das alternativas supra mencionadas, que são muito menos severas para com o pobre brasileiro, nosso Governo Federal resolveu fazer o que foi efetivamente feito: jogou os encargos da “operação tapa buracos” nos ombros dos pobres, dos pequenos e médios empresários e produtores rurais.

É a corda arrebentando do lado mais fraco, como de costume.

ALEXANDRE COUTINHO PAGLIARINI é Professor de Ciência Política e Teoria do Estado da Faculdade de Direito do Sul de Minas – Procurador Municipal e Advogado do Escritório Artur Tavares Bettencourt e Associados (Telefax (035) 422-2627 / E-mail Erro! Indicador não definido.)

DA NOTÓRIA ESPECIALIZAÇÃO NA CONTRATAÇÃO POR ÓRGÃOS PÚBLICOS

A Constituição da República Federativa do Brasil, no inciso XXI, do art. 37, impôs à Administração Pública o dever de licitar. O texto constitucional merece transcrição:

“Ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações”.

Assim Municípios, Estados, Distrito Federal, União e entidades da administração pública indireta e fundacional têm a obrigação de submeter à prévia concorrência suas obras, serviços, compras e alienações.

Apesar da imposição maior, a mesma Carta Magna exclui da necessidade de prévia licitação os casos especificados na legislação infra constitucional.

A Lei que disciplina a Licitação Pública é a de nº 8.666/93. Nela estão previstas as modalidades de concorrência (Convite, Tomada de Preços, Leilão, Concorrência Pública e Concurso) bem como os procedimentos e providências a serem tomados pelo órgão licitante, tudo tendo em vista os princípios norteadores dos atos administrativos que são os da legalidade, moralidade, impessoalidade e publicidade (art. 37, caput, CF).

A mesma Lei ressalva casos em que a prévia concorrência para contratações é inexigível. É o instituto legal da Inexigibilidade de Licitação, previsto no caput e nos incisos e parágrafos do artigo 25.

Como exemplo, a contratação de profissionais notoriamente especializados não necessita de prévio certame licitatório.

Em primeiro lugar, para que tal serviço seja considerado como de notória especialização, mister que o mesmo esteja compreendido dentre as hipóteses enumeradas no art. 13 da Lei 8.666/93.

“Considera-se de notória especialização o profissional ou empresa cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica, ou de outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato” (§ 1º, art. 25).

Necessitando a administração da singularidade dos serviços de um notório especialista, afasta-se a licitação, por ser impossível o confronto do certame com a necessidade específica de se contratar alguém que efetivamente esteja afeto ao objeto do contrato.

Um caso hipotético: é indiscutível que o Poder Público necessita modernizar os serviços de combate à proliferação de doenças contagiosas. Com vistas à otimização de tais serviços, contrata-se sem licitação (por inexigibilidade) notório especialista, no caso, um sanitarista experiente e conhecido regionalmente, de vasto conhecimento na área da saúde pública. Sem dúvida, esta contratação inexigia prévia licitação, por estar em conformidade com os artigos 13 e 25 da Lei 8.666/93 e, fundamentalmente, por ter aquele profissional condições técnicas de bem executar o objetivo da Administração, quer seja, o de melhorar o combate à proliferação de doenças contagiosas.

Outro caso hipotético: Entidades como Prefeituras e Câmaras Municipais necessitam de profissionais que tenham condições de prestar assessoria na áreas tributária, administrativa, constitucional e eleitoral. Por ter o campo do Direito Público princípios e preceitos completamente diferentes do Direito Privado, o Poder Público resolve contratar, por inexigibilidade, profissionais neste ramo do direito, reconhecidos regionalmente, com experiência e notório “know how”. Tal contratação, obviamente, inexigia concorrência prévia, nos termos das disposições legais já citadas.

Por fim, para que o procedimento de inexibilidade de licitação se efetue de maneira legal, há que se atentar para o preço cobrado pelo profissional de notória especialização, que deve seguir a média do preço dos demais especialistas na região, não podendo-se usar como parâmetro o que seria cobrado por um notório profissional atuante nas capitais ou no exterior.

ALEXANDRE COUTINHO PAGLIARINI é Professor de Ciência Política e Teoria do Estado da Faculdade de Direito do Sul de Minas – Procurador Municipal e Advogado do Escritório Artur Tavares Bettencourt e Associados (Telefax (035) 422-2627 / Home Page http://www.overnet.com.br/~alex/

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